ARTIGOS

OBESIDADE X CÂNCER

Dr. André Luiz Maynart®, Endocrinologia, Brasil

28 Setembro 2016

O presente artigo contém o resultado de um grupo de trabalho convocado em Abril de 2016 pela IARC (International Agency for Research on Cancer), cujo objetivo era reavaliar as evidências científicas de benefício no tocante à relação entre controle da obesidade e diminuição no risco de câncer.

Em 2002, essa mesma entidade médica havia feito trabalho semelhante, no qual ficou demonstrado, naquela época, que a obesidade está definitivamente associada à ocorrência de câncer nos seguintes sítios: cólon, esôfago (adenocarcinoma), rim, mama e útero. Agora, novas evidências comprovam que a obesidade também está relacionada à ocorrência de câncer em outros sítios, e que a diminuição do peso corpóreo, além de outros benefícios, reduz a incidência de todos esses cânceres…

São OITO os novos tipos de neoplasia cuja relação com obesidade foi agora reconhecida:
1- Cardia.
2- Vesícula Biliar.
3- Fígado.
4- Pâncreas.
5- Ovário.
6- Tireoide.
7- Mieloma Múltiplo.
8- Meningioma.

Em 2014, cerca de 640 milhões de adultos apresentavam obesidade no mundo (crescimento de 6x no número de obesos em comparação com 1975), além de cerca de 110 milhões crianças (crescimento de 2x em comparação com 1980). Algo em torno de 10.8% dos homens adultos no mundo estavam obesos naquele ano, com 14.9% das mulheres e 5% das crianças. Englobando também a população com critérios de sobrepeso (lembrando: sobrepeso = IMC entre 25 e 29.99; obesidade = IMC > 30), pode-se dizer que, atualmente, existem mais pessoas com sobrepeso/obesidade do que pessoas com baixo peso. Além disso, estimativas apontam que 4.5 milhões de óbitos tiveram como causa básica a obesidade. Em relação ao câncer, o montante de 9% da carga de neoplasias malignas pode ser diretamente atribuído à obesidade, pelo menos nos EUA, Europa e Oriente Médio. Não podemos esquecer que os principais determinantes da pandemia de obesidade são modificáveis e preveníveis: (1) dieta inadequada (fator mais importante), (2) inatividade física (fator de importância secundária).

Mais de 1.000 estudos publicados nos últimos anos a respeito desse tema foram revisados. Diversas medidas de associação foram produzidas, inclusive com demonstração de forte “relação dose-resposta” entre obesidade e certos tipos de câncer, principalmente colorreto, cardia, fígado, vesícula biliar, pâncreas, rim, adenocarcinoma de esôfago e útero (endométrio). Os dois últimos, diga-se de passagem, estão FORTEMENTE ASSOCIADOS à obesidade, com risco relativo de adenocarcinoma de esôfago chegando a 4.8 para pacientes com IMC > 40 (superobesos), e risco relativo de 7.1 para câncer de endométrio com um IMC > 30 (obesos mórbidos). Tais associações NÃO se modificaram quando populações de regiões geográficas restritas foram especificamente analisadas (isto é, as relações persistiram em todas as partes do mundo onde estudos foram conduzidos). O mesmo é válido para sexo e background genético: homens e mulheres de todas as raças, em diferentes locais, adquirem risco aumentado de câncer na medida em que acumulam um excesso de tecido adiposo no corpo!!! Um dado muito interessante apontado por este estudo foi o seguinte: com exceção do câncer de mama pós-menopausa, todas as neoplasias associadas com aumento do IMC na vida adulta tiveram risco aumentado em pessoas com história de IMC aumentado na infância ou adolescência. Dito de outro modo, a história de obesidade no início da vida parece aumentar a chance de câncer no futuro, mesmo que o paciente perca peso (nestes casos, a magnitude da associação foi menor que a de pacientes adultos com IMC efetivamente alto).

Além dos novos cânceres cuja associação causal com obesidade passou a ser considerada definitiva, outras neoplasias mostraram uma associação causal PROVÁVEL (evidências limitadas)… Estamos falando do câncer de próstata fatal, linfoma difuso de grandes células B e câncer de mama masculino.

Para certos tipos de câncer, nenhuma associação causal com obesidade foi documentada, apesar de outros autores terem sugerido sua existência. São eles: pulmão, carcinoma escamoso do esôfago, estômago não-cardia, colangiocarcinoma (via biliar extra-hepática), melanoma, testículo, bexiga e gliomas (cérebro e medula espinhal).

 

Mulher com obesidade

Imagem meramente ilustrativa

OBESIDADE versus PROGNÓSTICO DAS NEOPLASIAS

Há fortes evidências de que um IMC elevado quando do diagnóstico do câncer de mama se associa de maneira independente a uma menor expectativa de vida para o paciente. Este tipo de associação também foi encontrado para outros cânceres, porém, as evidências não foram tão contundentes quanto para o câncer de mama. Um estudo intervencionista, inclusive, mostrou que a redução do peso corpóreo com dieta, em pacientes que receberam um diagnóstico de CA de mama, reduziu a taxa de recidiva da doença após o tratamento inicial.

MODELOS EXPERIMENTAIS

Alguns estudos confirmaram a existência de uma relação causal entre obesidade e câncer em roedores. Basicamente os mesmos tipos de neoplasia citados para os seres humanos tiveram sua incidência aumentada nesses animais… Tais modelos também permitiram analisar especificamente o efeito da perda de peso sobre a chance de ocorrência daquelas neoplasias: para a maioria delas, o risco diminuiu com dietas que impediam o acúmulo corporal de gordura!

PLAUSIBILIDADE BIOLÓGICA DA ASSOCIAÇÃO

Alguns estudos se debruçaram sobre a relação entre obesidade e carcinogênese em termos dos mecanismos biológicos que vinculam os dois fenômenos. Sabe-se que a obesidade se associa a desequilíbrios metabólicos e hormonais que afetam áreas como: (1) o catabolismo dos hormônios sexuais, (2) a sensibilidade à insulina e ao IGF-1, (3) a secreção de adiponectina, (4) o tônus “inflamatório” do organismo. As evidências são “robustas” em se tratando da relação etiopatogênica entre inflamação sistêmica induzida pela obesidade e aumento no risco da maioria dos cânceres, bem como existem evidências fidedignas quanto à relação entre alterações no metabolismo de hormônios sexuais e cânceres relacionados à obesidade. No tocante à hiperinsulinemia (resistência à insulina) associada à obesidade, as evidências de associação deste mecanismo com a carcinogênese são “moderadas”. De forma análoga, existem evidências experimentais de que uma perda de peso intencional pode modificar de forma positiva todas essas alterações endócrino-metabólicas, justificando a associação entre controle da obesidade e diminuição do risco de câncer.

CONCLUSÕES

Não possuir um excesso de gordura no corpo se associa a um menor risco de câncer em comparação com pessoas obesas ou com sobrepeso. A diminuição do excesso de gordura corporal existente provavelmente diminui a chance de câncer: as evidências a esse respeito são mais consistentes nos modelos animais – no homem, mais estudos são necessários, mas de qualquer modo acredita-se que o benefício seja idêntico.

Tratamento da Obesidade

Imagem meramente ilustrativa

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